domingo, 4 de novembro de 2007

DRAMAS TÍPICOS DE UM PAI BRASILEIRO (Samuel Rangel)

Hoje não consegui fazer o toddynho para o meu filho.

Quando olhei o pacote de leite longa vida, percebi que se a vida é longa não é graças ao leite. Estranhamente, a revolta que senti foi como se eu houvesse sido traído. Alguém que entra na minha casa, jurando que me faria bem, e ao meu filho também, revela-se como um veneno torpe, embalado ao som do tilintar de moedas imorais.

Imaginei que, enquanto eu servia o leitinho, ele poderia me perguntar o que é Soda Cáustica. É com freqüência que nossas crianças nos fazem perguntas constrangedoras. Percebi que se tal coisa acontecesse, meu filho poderia achar que eu, seu pai, que tanto lhe faço juras de amor, poderia estar servindo veneno ao próprio filho. Com certeza, apesar de toda a sua inteligência, isso estremeceria nosso sólido relacionamento de pai e filho. Parei ali, encostado na pia da cozinha, imaginando o que serviria para o meu tão amado descendente.

Sem solução, pensei em oferecer um frango. Mas como não tenho certeza alguma da procedência da água que colocam ilegalmente no Frango congelado, para que os jucás brasileiros paguem mais pelo menos, imaginei que não seria saudável.

Como meu filho estava envolvido com a programação da televisão, deixei de lado a idéia da alimentação. Mas como pai brasileiro não pode olhar para lado nenhum, percebi que a programação de domingo é uma espécie de droga, que definha o cérebro humano, debilidade essa que só é percebida na época das eleições.

E agora, tiro ele da frente da televisão e dou o leite? Mas eu tenho o dever de afastá-lo das drogas. O que farei? Surgiu-me a idéia de convida meu filho para dar umas voltas de carro, mas lembrei-me que o meu carro está falhando, pois um combustível adulterado estragou os bicos da injeção eletrônica. Ficar com o carro parado durante a noite, com a criminalidade crescente, seria no mínimo uma irresponsabilidade.

Olhando para ele, eu seguia tentando achar uma solução para o impasse. Eu, nacionalidade? Brasileiro. Pai por vocação, sentindo-me um trouxa por excelência. Mas como sou brasileiro e não desisto nunca tentei pensar em uma solução.

E católico que sou pedi a Deus a sua Luz.

Lembrei-me que ando em falta com Deus, pois há muito não tenho levado meu filho à igreja. Será que eu teria direito de pedir Luz?

Mas ao pensar em igreja, olhando para o meu filho, percebi que nem isso mais é seguro. Se as coisas continuarem assim, em algum tempo, os católicos rezarão para que os seus filhos não queiram jamais ser coroinhas. Escândalos de pedofilia envolvendo padres estão explodindo na imprensa. Mas acho que Deus não tem nada a ver com estes falsos padres.

E dá para acreditar na imprensa? A Record é conhecida rival da Igreja Católica. Seria mais ou menos como perguntar ao árabe se posso confiar naquele judeu.

E pedi a Deus que me iluminasse.

Devo investir então na educação de meu filho. Mas nem aí encontrei descanso. Se o coloco em um colégio público, faço-o conviver com alunos que quebram o braço de suas professoras, além de sentenciá-lo à absoluta falta de oportunidade em uma faculdade. Se o coloco em colégio privado, tenho quase garantido o seu bom ensino, e com certeza ele chegará à faculdade.

Mas neste momento, o desespero aparece. Ele entrará em uma faculdade, e lá haverá de ter seu primeiro grande choque. Outrora um moleque, agora um universitário. E na faculdade ouvirá mais tempo os professores e os colegas do que seu pai. É o momento da ruptura da relação que um dia foi regada a leite. Ele escolherá suas próprias bebidas, escolherá seus programas de televisão, suas companhias nas idas para a praia, e muito provavelmente as companhias em suas festas.

O horror agora é inevitável.

Quando falo de festa, e sem querer dizer que não tenha feito minhas bobagens também, pensei nestas festas que duram trinta horas, com gente pulando sem parar e ingerindo comprimidos alucinógenos que elevam a temperatura do corpo a mais de quarenta graus. Então acho que não devo permitir ao meu filho que vá a lugares onde a água custa mais caro que uma cerveja. Mas também não o que achando a cerveja barata. Mas será que ainda poderei permitir ou não permitir algo?

Na televisão os pais de um menino de dezessete anos que faleceu em uma festa dessas, choram a sua perda. E eu não posso perder tempo, para não perder esse jogo cruel e sacana.

Mais uma vez penso Meu Deus!

Só que agora, sabendo ter ele me iluminado durante minhas tentativas de decisões e soluções, começo a perceber que ser pai neste país, e alcançar a glória de ver seu filho crescer, depende de milagres, que contrariem as perspectivas e as estatísticas.

Sei que não é só aqui, mas o brasileiro, com seu humor solto e sua irreverência, fez convite ao caos.

O caos está aí, e já passou de nossa porta. Com ele trouxe o silêncio, e o silêncio nos é um simpático conhecido. O silêncio e o caos então, sentados em nossa sala, nos observam, esperando a hora de nos mostrar a realidade. Quanto ao caos, não consegui fazer nada por enquanto, mas em relação ao silêncio, eu rompi nestas linhas.

E com o silêncio rompido, convido você leitor, a ajudar-me a tirar o caos de nossa sala. Preciso de uma ou duas palavras suas, e elas custam bem menos que um pacote de leite.

PRECISO DE UM MILAGRE. PRECISO QUE VOCÊ SE MANIFESTE COMENTANDO ESSE TEXTO.

Todos os comentários serão mantidos.

Peço que você mande este texto para o maior número de pessoas que puder. Esse pode ser o milagre que tanto esperamos.

Vamos conferir o resultado daqui algum tempo.

2 comentários:

Lili Marlene disse...

Samuca, vc escreve a realidade de uma maneira que me impressiona.
Voltei de férias semana passada e ainda não consegui ler todos os seus posts que eu perdi nesse tempo.
Sou sua fã declaradíssima.

Sobre o assunto do post: não tenho filhos, mas tenho sobrinhos, afilhados e uma irmã bem mais nova que eu e com todas essas tragédias de leite, escândalos sexuais, drogas, etc, tenho medo de pensar no que vai ser do futuro deles.
O pior é saber que nada disso depende só dos pais. Tenho amigos que tiveram pais excelentes, que conversavam com eles sobre tudo, que tinham a cabeça aberta, que informavam, que ouviam, que falavam, mas que não conseguiram manter seus filhos longe das drogas.
Acredito que você está certo: é preciso um milagre. E dos grandes!
Bjo
Lili

Ari Fior disse...

Samuel!! Você precisa é escrever um livro!! Seus textos são simplesmente extraordinários!
Parabéns e mto sucesso pra você...

Beijos