segunda-feira, 30 de março de 2009

PARABÉNS CURITIBA, DO TRÂNSITO ATÉ AS VILAS

Fotos cedidas pela fotógrafa Juliana Ribas


Ah Curitiba! Esta minha cidade, minha maternidade e companheira das crônicas que vivi em minha vida, desde aquelas mais cotidianas até as mais inacreditáveis. E Curitiba não escapa de críticas justas e injustas, pois feita de homens e mulheres pintados em desvirtudes, ela é o coletivo do ser humano.
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Não foram poucas as homenagens feitas à Curitiba pela passagem de seus trezentos e dezesseis anos. Homenagens em textos, imagens e sons que refletem um pouco dessa metrópole meio provinciana, desse paradoxo de concreto e vida.
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Na imperfeição de seu trânsito, descobri que não é verdade que o trânsito de Curitiba seja ruim. Percebendo com um pouco mais de complacência e atenção esse trânsito, o que se perceber é que a má ideia foi a campanha publicitária de alguma marca de cereais, do tipo: “Compre Sucrilhos Barbante e ganhe uma carteira de motorista.” O que falta então é uma legislação própria de trânsito, onde poderíamos organizar da seguinte forma: Nas vias rápidas, quem comprou carteira em Santa Catarina anda pela pista da Esquerda, quem ganhou a carteira de motorista na caixa de cereais pela direita, e pela pista do meio, o pessoal que realmente fez teste no Detran.
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Mas em uma abordagem mais séria sobre o tema, é interessante ver o curitibano reclamar do trânsito desta cidade, quando na verdade, existem famílias com mais de um carro por pessoa. Exatamente isso, essa mania de curitibano ter carro até para o cachorro, é que dificulta o trânsito. Quem sabe isso tem relação com o modo fechado do curitibano. Para não ter que falar com o seu filho ou com sua esposa, o curitibano prefere dar um carro para cada um e pronto.
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Mas esse jeito fechado do curitibano também não é sem razão. O que acontece na realidade, é que o curitibano realmente leva a sério demais as lições de sua infância. Quando a titia falava (sem olhar nos nossos olhos) “não fale com estranhos”, o curitibano levava isso para o resto da vida. E cá entre nós, hoje em dia temos filhos estranhos, mulheres estranhas, as mulheres por sua vez tem maridos estranhos. Então não falemos com estranhos e pronto.
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Mas em falar em gente estranha, dessa festa esquisita, ninguém é mais estrando que o curitibano mesmo. Até hoje eu tento entender as bermudas longas dos “vileiros”, os rituais de acasalamento nas boates da classe média, os pratos irrisórios que são vendidos por valores exorbitantes nos restaurantes da alta sociedade. Ou mesmo o público que não sabe bem ao certo em que momento bater palmas nos espetáculos públicos. Esse Curitibano tão europeu que muitas vezes coloca para fora sua pouca autoestima de terceiro mundo.
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Curitiba quem sabe seja esse estranho ponto do universo onde diferenças convivam harmonicamente. A Ferrari encostada no posto de gasolina ao lado do Corcel caindo aos pedaços ( Eles vivem harmonicamente porque não se falam. Lógico!) O mármore do fórum ao lado da poeira do estacionamento. O parque Barigui, de linhagem europeia, sendo cortado pelo rio de mesmo nome, onde cada peixe é um sobrevivente do reator de uma usina nuclear. E para sacramentar as diferenças, ainda surge um jacaré comedor de cachorrinhos provocativos.
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Curitiba é mesmo assim. Tão criticada pelos curitibanos, que ironicamente, são exatamente aqueles que temperam a cidade com suas imperfeições e problemas. Mas embora Curitiba seja esse alvo da piada Tingui, Curitiba merece, ao menos de minha parte, uma combativa defesa.
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Foi aqui, onde já não se tem mais tanto pinhão, que tive a oportunidade de aprender a tocar cavaquinho, do rodapé de meus quatorze anos, com o mestre e gênio Janguito do Rosário. Foi aqui, na piscina do Clube 3 Marias, que tive a oportunidade de pegar uma piscina nos finais de semana com o gênio fantástico de Paulo Leminski. E porque não dizer que esta cidade é que me deu a possibilidade de conviver com a fotógrada Juliana Ribas, que me oferece as imagens para este texto.
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Em Curitiba tive a oportunidade de dividir o palco do Bar Sarinha com Ivo Rodrigues, aquele gênio de voz inigualável da Banda Blindagem. No palco do Guairinha tive a honra de ajudar na produção da peça de Dig Dutra, que retornava do Rio para o Festival de Teatro. Em Curitiba tive a oportunidade de conhecer redutos de boemia que até hoje dançam em minha memória. Nos teatros de Curitiba é que tive a oportunidade de expor Curitiba e rir muito com os curitibanos, ao flutuar as asas dos Anjos Boêmios.
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E embora eu me permita criticar essa cidade e as pessoas que a dividem comigo, devo tudo isso a Curitiba. Devo a Curitiba a oportunidade de ser exatamente o que sou hoje. Um Curitibano antipático as vezes, e outras vezes o morador do bigorrilho sorridente. O advogado que frequenta o fórum de terno e gravata, e o jardineiro da própria casa que desfila de bermudas furadas no jardim de sábado. Em Curitiba posso ser apenas o autor desse texto, um rosto distante e virtual, ou mesmo aquele que fica preso no engarrafamento, desapercebido e incógnito, um anônimo que pensa em como homenagear essa cidade.
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Seja como for, minha forma de homenagear é agradecer. Apenas agradecer por tudo o que Curitiba me permitiu ser: “Um Curitibano”.