quinta-feira, 2 de julho de 2009

O CASO DO MORRO DO BOI, ESTARDALHAÇOS, E OS VELHOS TRUQUES QUASE PERFEITOS




O lamentável e público caso do Morro do Boi, que ceifou a vida do jovem e promissor Osíres Del Corso, deixando ainda graves sequelas para a sua namorada Monik Pergorari Lima, não parece ter sido encerrado. Muitas outras vítimas e sequelas serão deixadas por essa tragédia humana, emergida do mais absurdo vácuo da alma de algum ser que deveríamos poder chamar de semelhante.
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Após uma investigação difícil, feita por uma polícia carente, em meio a uma cobrança voraz da imprensa e da opinião pública que ela move, o caso parecia ter sua solução clara com a prisão e identificação do acusado Juarez Ferreira Pinto.
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O reconhecimento de Juarez pela vítima sobrevivente, e aqui, por mais desnecessário que pareça, frisamos que as vítimas do referido caso, são e sempre serão apenas Osíres e sua namorada, parecia dar o desfecho necessário para todos aqueles que perseguiam a justiça, ávidos de uma reposta para a barbaria.
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Porém, cinco meses após a data em que ocorreu a bestialidade, e quatro meses após a prisão do acusado reconhecido por Monik, surpreendentemente surge um outro homicida, Paulo Delci Unfried, que desta vez, em teoria espontaneamente, confessa a autoria dessa monstruosidade.
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Como vivemos num país de absurdos, tropeços e episódios de idiotia coletiva, não é difícil que ocorram erros em processos judiciais. Tantos já figuram no rol de vergonhas de nossa Justiça, que seria tolice, com a experiência de quinze anos perante o Egrégio Tribunal do Júri, de pronto afastar a possibilidade de um erro na investigação que levasse um inocente ao cárcere.
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Mas o que chama a atenção, é que a mesma imprensa que cobrou resultados nas investigações, nesta última terça-feria, faz estampar a manchete do caso a palavra inocente, para sentenciar em nome da opinião pública a absolvição moral de Juarez. E isso antes mesmo de ouvir a VÍTIMA (em letras maiúsculas pela necessidade de advertir) que reconheceu o seu algoz. E de pronto o caso volta a ocupar as edições nacionais dos telejornais, desta vez não mais como o caso do Morro do Boi, onde Osíres e sua namorada são as verdadeiras vítimas, mas o novo caso do Morro do Boi, onde Juarez, aquele mesmo reconhecido como homicida, ladrão e maníaco sexual, seria uma suposta “vítima” de um erro das autoridades relacionadas à justiça.
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E com a mesma força que a imprensa sentenciou o monstro, agora o transforma no cordeiro inofensivo e injustiçado, como se sentenciasse agora a vítima sobrevivente, ao vexame do erro, do acusar injusto, e de fazer um cordeiro inocente permanecer quatro meses sob os horrores do cárcere.
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Em entrevista coletiva, alguns advogados já se pronunciam manifestando seu otimismo em relação ao pedido de liberdade, e alguns familiares chegam a falar em indenizações, tudo isso deixando bem claro o quanto é tênue a linha do justo e o quanto é frágil a justiça que essa linha sustenta. Mas as declarações são veementes, como devem ser os advogados que atuam em plenário de Júri, pois até mesmo a arma utilizada no crime foi reconhecida no exame de balística. E são tão veementes as argumentações e as notícias, que quase emudecem a voz da vítima sobrevivente.
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Do que aí está, um quadro que encaminha para a incerteza carrega uma multidão pela mão, fazendo e desfazendo a opinião pública, dizendo e desdizendo a justiça e o direito, repudiando e enaltecendo ora acusado, ora vítima, apagando as luzes do justo e nos levando à insegurança.
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Em virtude dos anos que já passei em plenário, da convivência como advogado que tive com centenas de casos de homicídio, com o Tribunal do Júri, e com as decisões que ele profere através de seus Jurados, na quase absoluta maioria preocupados com a justa decisão, receio que o ocorrido possa trazer grandes prejuízos à Justiça como busca maior dos operadores do Direito, e como elemento legitimador de nossa atuação.
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Primeiramente, porque ainda que o réu confesso que surge surpreendentemente nesta fase do processo tenha feito a aludida confissão, há de se lembrar que a confissão não é suficiente para condenar qualquer pessoa quando outras provas colidam com essa declaração.
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Segundo, porque a confissão feita fora do processo (compreende-se o Inquérito Policial), ao largo da ampla defesa e do contraditório, não se presta como prova jurisdicionalizada, e logo, não tem o força probatória para sustentar uma condenação, sem que seja ratificada integralmente em juízo, bem como corroborada pelos demais elementos probatórios contidos nos Autos.
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Terceiro, que a experiência forense que divido com uma multidão de operadores do direito, mostra-nos claramente que a confissão prestada na fase inquisitorial (no Inquérito Policial), na maioria das vezes não é ratificada em juízo, muitas vezes, sob os argumentos de réus que alegam ter confessado em função de tortura física ou psicológica.
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Quarto, em função de que seria uma excrescência levar dois réus a julgamento por uma fato cometido por uma só pessoa. Tal atitude seria tão absurda, e tornaria a acusação tão frágil, que por certo levaria a absolvição dos dois acusados, igualmente, tanto o inocente quanto o culpado.
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Destas considerações, resta-nos apenas uma advertência a fazer. O surgimento deste segundo acusado, reflete numa grande probabilidade de após o julgamento pelo júri (se prevalecer a competência do crime doloso contra a vida), ao final do caso, serem os dois acusados absolvidos.
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Assim, após os estardalhaços do Caso do Morro do Boi, e dos velhos truques, os acusados seriam absolvidos, tornando-se vítimas de uma acusação supostamente falsa.
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Por outro lado, e tão frágeis quanto no momento em que eram atingidos pelos projéteis disparados pela besta, as vítimas estariam sendo condenadas à injustiça, condenadas a não ver a justa reposta para o mal que lhes fizeram. A vítima que reconheceu o primeiro acusado então estaria sendo sentenciada por ter levado ao cárcere um inocente.
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A inversão de valores não nos surpreende mais, porém, a injustiça na qual ela resulta, pode refletir em uma atrocidade tão ou pior a aquela que deu origem ao caso.
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Conveniente citar um caso aqui de nossa Capital, onde a defesa do acusado, para tentar livrar-lhe da condenação, acusou a então vítima de prostituição e tráfico, desdenhando do fato de se tratar tal vítima de uma menina de apenas 11 anos.
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O estardalhaço deve ser contido, os velhos truques devem ser observados, reconhecidos, detectados e responsabilizados, inclusive em relação a todo e qualquer partícipe ou coautor destas manobras, para que o processo seja levado a julgamento com a cautela e responsabilidade que a Justiça requer.
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Em meio a esses rumores e tumultos processuais, não parece ser coerente conceder a liberdade a Juarez, sem que antes se esgote os meios de avaliação do que há de prova no processo, bem como, da validade dessas provas, e da certeza de que elas serão materializadas e resguardadas em conteúdo até o final julgamento.
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E levando-se em conta que, é público que Paulo teria tentado “suicídio” momentos antes de prestar o seu depoimento, onde teoricamente confessa a prática da atrocidade, ainda no sentido da advertência, a morte acidental, incidental, ou mesmo por causas naturais do cidadão que confessa o crime, ainda antes de sua denúncia e responsabilização criminal, teria o condão de por fim ao processo? Seria considerado satisfatório o resultado da investigação e da atuação jurisdicional?
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Ao que parece, para a família das verdadeiras vítima não.
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Em Honra a Memória de Osíres Del Corso. Um jovem que num mundo de egocentrismos violentos, perdeu a vida defendendo a sua namorada, dando pleno e belo exemplo do cavalheirismo além dos tempos.