quinta-feira, 23 de agosto de 2007

UM BAR CHAMADO PONTO FINAL - por Samuel Rangel

PONTO FINAL – O BAR
Em 1991, quando idealizamos e realizamos a Quinta no CAHS (uma festa do Curso de Direito da UFPR que acontecia todas as quintas), os alunos mais antigos da faculdade sugeriram que levássemos para cantar um ex-aluno, que formado pela casa havia largado a advocacia para abrir um Bar.
Então conheci a pessoa de Riad Bark. Vendo-o tocar naquela festa, percebi que era dono de uma belíssimo voz e de um vasto repertório. Simpático como sempre, convidou-me a dar uma canja em seu bar.
Como estava no início do relacionamento com Danielle, entendi que era interessante para fortalecer o namoro, que eu a levasse lá e prestasse minhas homenagens com algumas canções.
Foi assim que comecei a frequentar o Ponto Final. Em 1991.
E de lá para cá eu e Riad a tudo passamos. Vivemos a perda dos irmãos do Riad, inclusive o simpático companheiro de palco Turquinho, a quem dediquei os meus mais responsáveis cuidados.
De cima daquele palco, que resistiu ao tempo até este mês, testemunhamos muito, e não seria errado dizer que a vida nos tirou muito também. Hoje, eu com meus cabelos brancos, e o Riad já quase sem os dele (desculpa aí amigo, mas eu precisava aproveitar a piada), temos muitas histórias entre aquelas paredes verdes.
Temos amigos que duram além dos anos. Temos pessoas que nos reconhecem nas ruas e nos mais inusitados lugares. As vezes não sabem nosso nome, mas sabem exatamente o que fazemos.
Sabem o que fazemos por que nos viram fazer.
E se nos viram fazer, vai aqui meu testemunho em relação ao Riad.
Se em algum momento, você meu amigo Turco, sentir cansaço, e houve um canto de sereia te convidando a largar esse teu trabalho, saiba sempre que você não pode nos largar.
Foi ali, dentre aquelas paredes, que tantos e tantos namoros começaram, hoje carregando filhos pelas mãos. E não seria errado dizer que os filhos de seus primeiros ouvintes hoje se amontoam as sextas-feiras para ouvir as mesmas músicas que ouviam seus pais. Foi exatamente dentre aquelas paredes de vimos tantas e tantas amizades desafiarem tudo e todos, para hoje fazer do Ponto Final, algo maior do que um bar. O Ponto Final hoje é um universo a parte. Um universo onde se pratica uma música artesanal e de qualidade. Um universo onde jovens de vinte e poucos anos, ouvem e cantam junto a música de Sérgio Bitencourt.
Meu amigo Riad, minha amiga Marlene, Morais, Juarez e todos os outros da equipe. Vocês não são apenas donos de um bar como tantos e tantos por aí. Vocês são os anfitriões da dimensão paralela, os comandantes da resistência, os amigos que fazem amigo os amigos dos amigos.
Um bar de Julianas e Lucianas, Andréias e Adrianas. E com o perdão pelos nomes que o tempo me roubou, o bar da Drika, do França, da Babi, da Jurema, da Tiana, do Diniz, do Aujor, da Ju Brandão e da Ângela, do Amilton, do Henrique, do Boca, da Luzia, da Ju Bertuzzi e da Vivi, da Ander e do Arthur, do Negretti e do Trói, da Michelle, da Vilmari e da Flávia, do Daniel e da Cláudia, da Fernanda, do Zé Maurício, do Andretta, do Domingos, do Dartagnan, do Ronaldo, do Ítalo ... Um bar de todos nós.

Um grande abraço

Samuel Rangel

Ps. E com certeza o Caê achou que eu ia esquecer de fazer esse remendo. Mas ta aqui o registro do cara que tem a voz mais potente do Ponto Final.

O Opala, A Caloi Dobrável e a Zorba - por Samuel Rangel

Curitiba – 1983. Final de Primavera.
O casal sai de casa para fazer o fornecimento (forma com que os antigos se referiam às compras mensais de mercado). Em casa fica a filha acompanhada de seu namoradinho, e o irmão, sentado na sala acompanhando atento os acontecimentos e fiscalizando os movimentos das mãos.
Em um determinado momento, o rapazinho com pouco mais de dezesseis anos, oferece sua bicicleta para que o irmão segurança mirim, vá até o Jardim Ambiental gastar um pouco de sua energia. Como os pais dificilmente deixavam o menino sair, e nunca de bicicleta, o menino de olhos brilhantes sai com a Caloi dobrável rumo ao Ambiental.
Agora, ali, naquela casa, um casal de dezesseis anos, borbulhando hormônios e afoitos de curiosidade, resolve iniciar sua vida corporal em seu sentido anatômico. O rapazinho de pouca experiência, tira a calça de uma vez só descendo em conjunto a calça e a cueca. E ali começam as brincadeiras que a idade permite.
Após alguns olhares estranhos e algumas poucas experiências do tato, o ronco do Opala 250S faz vibrar a garagem da casa. A menina pula do sofá e grita: Meus Pais. O rapaz grita: Ai! Rapidamente veste a calça. Sentam-se no sofá comportadamente. Enquanto o pai passa com os pacotes do mercado, que na época eram de papelão, a mãe vai direto ao quarto. O rapaz percebe que o seu companheiro de virilidade esta a denunciar o seu passado próximo, e cruza a perna.
Ouve-se passos no corredor da casa. Eram sapatos de mulher que batucavam no piso de tacos com sinteco. A menina repara na barra da calça do moleque que um bom quinhão da Zorba de está de fora. O rapaz havia vestido a calça, porém a cueca havia ficado por dentro da calça embolada em uma das pernas. Com a voz suave e trêmula de uma adolescente ela informa o rapaz da problemática posição da Zorba. O rapaz descruza a perna em uma velocidade tal que a cueca sai voando pela sala, caindo caprichosamente sobre a mesa do abajur.
O casalzinho fica imóvel. A mãe adentra à sala e caminha predadora em direção a eles. Não há o que fazer. O ar desaparece do ambiente, enquanto os dois jovenzinhos esperam em apnéia seu triste desiderato. A mãe segue em direção, curva-se rapidamente e a recolhe. Olha para o rapaz e diz: Desculpe a bagunça. Você sabe como são esses meninos. Em falar nisso, onde esta o Junior (claro que o nome é fictício)?
O rapaz rapidamente diz. Está ali fora! Vou chamá-lo! E sai da sala com as canelas de um veado fazendo um risco no taquaral.
A mãe olha para a filha e diz: Ele é uma gracinha!
A menina não responde.
O rapaz localiza o filhote de ex-cunhado no Jardim Ambiental e toma-lhe a bicicleta dizendo. Sua mãe esta lhe chamando. E tem que ser rápido.
O que aconteceu depois?
Uns dizem que o rapaz nunca mais voltou à casa da pobre menina. Outros dizem que ele voltou, namoraram, casaram e hoje sua filha dorme com o namorado em seu próprio quarto.
Alguns dizem que hoje é um político renomado.
Há quem diga que o rapaz virou jardineiro nos Estados Unidos.
E há quem diga que essa história nunca aconteceu.
Seja como for, resolvi contar.
E ainda que seja mentira, melhor essa do que as vacas do Calheiros.
Mas a moral da história?
Pois é:
Em 1982, Opala 250S era carro até no Jardim Social, piso chique era sinteco, cueca boa era Zorba, e com uma Caloi dobrável você até conseguia uma boa iniciação nas artes do amor. Em 2007 as coisas andam um pouco diferentes, mas a Zorba continua sendo uma boa cueca, tão comum que pode até ser confundida com a do seu cunhado.