Na cancha de cimento do condomínio, crianças se divertem com a bola. Em um jogo de parcas regras vão disputando um pouco de futebol, depois vôlei, e até basquete. Incansáveis, suadas e com a cara suja, elas disputam indefinidas partidas.
Sentado em um banco ao lado da cancha esta um homem, cerca de quarenta anos. Observa o jogo atentamente, mas é de se notar que seus olhos não acompanham a bola e dedicam-se quase exclusivamente a um do moleques. Não é o mais hábil aquele moleque, e tentando entender o motivo da observação atenta e especial, logo se nota que não é só um olhar, mas quase uma certidão de nascimento que firma a paternidade.
E não demora muito para que o pai chame seu filo no alambrado, fala a ele algumas palavras e o menino sai otimista e renovado atrás da bola. Mais três tentativas e mais três erros. Nota-se que o pai tem uma certa preocupação em seu semblante. Vê-se com ímpar clareza que a atuação do menino nas partidas não agrada ao pai, que por sua vez, ainda que preocupado, continua a observar o seu filho.
E passam-se mais dez, mais vinte, mais uma porção de tentativas e nada. O menino não alcança a glória de um ponto sequer. Passam-se longos minutos e o pai continua sua observação, até que balança a cabeça e deixa escapar um suave sorriso. Balançando a cabeça com indescritível aceitação, o pai lança seu cigarro ao longe, da as costas ao campo e volta ao seu sobrado.
Quando vi a cena, levou algum tempo, mas já com o pai na janela da sala do sobrado com o jornal em mãos, surgiu um sentimento de admiração. Ali estava um pai presente, torcendo pelo seu filho, e nos momentos necessários, dava-lhe alguns conselhos. Tinha a habilidade de renovar a esperança de seu filho a cada conselho.
Mas o fato de seu filho não se destacar no jogo, de ser apenas mais um jogador, e quem sabe até o pior dentre os que estavam em campo, não lhe tirou a serenidade. Não era um daqueles pais que fica gritando com o filho, dando-lhe ordens, exigindo seu sucesso.
O sorriso que deu ao final, revelou que a sua maneira ele aceitava as dificuldades do filho com naturalidade.
Ali uma grande mensagem surge em neon na nossa alma. Não devemos exigir de nossos filhos algo além de seus limites, e se tivermos respeito pelas suas habilidades, certamente, com o desenvolver de nossos filhos, haveremos de encontrar um talento, ou dois, ou mais dons que nos surpreendam.
Devemos nos afastar daquela idéia que domina as escolas americanas, dividindo crianças e jovens em dois grandes grupos maniqueístas: Os Ganhadores e os Perdedores.
Assim quem sabe possamos evitar que os perdedores, em um dia de horror, adentrem a uma escola e mostrem que seu verdadeiro talento esta na manipulação de uma arma, na mira louca que tira a vida não só de ganhadores, mas daqueles que tinham seu próprio direito de viver em seus próprios limites, cuja superação vem do crescimento, e não da exigência autoritária de um pai.
Samuel Rangel
segunda-feira, 27 de agosto de 2007
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