domingo, 30 de setembro de 2007

CORITIBA 1 X 0 IPATINGA – O Mineirinho, o Porquinho e o Radinho de Pilha (Samuel Rangel)

É sexta-feira, dia 28 de setembro de 2007.

O mineirinho está ouvindo a Rádio Ipatinguense Nacional dos Chapadões. Ele mora em uma chácara distante quinze quilômetros da cidade de Ipatinga. Lá tem suas criações, mas muito especialmente, tem amor pelo seu radinho de pilhas pelo qual tem o mundo aos seus ouvidos. Também esta bem feliz com o peso que vem ganhando o seu porquinho.

Torcedor fanático do Ipatinga Futebol Clube, ele acompanha a todos os lances da bela campanha do seu time na Segunda Divisão do Futebol Brasileiro.

O Ipatinga Futebol Clube foi fundado em 21 de maio de 1998. Fica ali na Av. Roberto Burle Marx, no Parque Ipanema da Pacata Ipatinga em Minas Gerais , conhecido como Tigre seu estádio é o Ipatingão, do próprio município (Epaminondas Mendes Brito) com capacidade para 35.000 pessoas, e é sempre apoiado pelas fanáticas torcidas Tigraço e Infatigre.

E você poderia perguntar que clube é esse, mas antes que você cometa tal desfeita, saiba que se trata do Campeão Estadual de Futebol do Estado de Minas Gerais de 2005, quando cozinhou o Galo e colocou a Raposa para correr.

O mineirinho parece estar impaciente. A mulher lhe chama para jantar e ele simplesmente faz de conta que não escuta. Ele simplesmente se cala, permanece ali enrolando seu cigarrinho de palha, deixando os olhos passearam pelo chiqueiro a namorar o pernil do simpático porquinho. O porquinho por sua vez, quando nota a presença do mineirinho, exibe-se logo esperando um punhado de restos.

Nesta sexta-feira, quando marcam oito e vinte da noite em seu velho relógio de cordas sobre a geladeira, o mineirinho liga o rádio de pilhas e vai até a varanda.

Como em todas as transmissões de partidas de futebol neste país, em Ipatinga não é diferente. Entre aquelas balelas o locutor do jogo inicia:

Lindomar. Já temos a escalação do Tigre?

Uma voz meio aguda e com som parecendo sair de dentro de uma lata confirma:

Temos sim Castilho. O Tigre vem de Fred no Gol, Márcio Gabriel, Léo Oliveira, Duílio e Beto. Henrique, Leandro Salino, Augusto Recife e Gérson Magrão. E na frente para infernizar a zaga Coxa Branca vem de Adeílson e Alessandro. O técnico é o professor Emerson Ávila que vem comandar o Tigre.

O locutor prossegue:

E o Coritiba Lindomar?

Vem a resposta:

Edson Bastos no Gol, Anderson Lima, Henrique, Jeci, Diogo, Veiga, Douglas Silva, Túlio, Ricardinho, Keirrison, Hugo. O Técnico é o talentoso professor René Simões, conhecido pelas suas conquistas com times femininos.

Dez minutos depois ele escuta atento o apito que dá o início ao jogo, e lá esta o seu glorioso Alviverde enfrentando o Coritiba. Com os ouvidos no rádio e os olhos no porquinho ali, bem próximo à varanda. O Mineirinho escuta atento a cada lance. Cada avanço do seu time é seguido de uma cuspida à floreira encostada na varanda, após o que vem a tradicional ajeitada no cigarrinho de palha.

Sua mulher o chama para jantar, mas ele não se afasta do rádio.

Ela insiste:

É Codorna com Quirera meu véio.

E ele nada.

Mas mulheres não entendem um homem ouvindo futebol pelo rádio, na mesma e exata proporção que homens não entendem por que devem levantar a tampa da patente para abaixar depois. Quando ela pensa em insistir ele a responde rispidamente, demonstrando claramente que ele não irá jantar antes do final do jogo.

Depois de trinta e cinco minutos de um burocrático futebol, o seu Ipatinga desce ao ataque com mais perigo. O mineirinho continua atento, e a cada lance uma nova cuspida no chão.

Quando o Ipatinga acertou a trave Coxa Branca, o mineirinho foi à loucura. Ali ficava claro de que o Ipatinga realmente tinha condições de vencer o jogo. Animado com o lance, o mineirinho agarra-se a um cajado curto, que ficava encostado ao lado do forno de barro no fundo do quintal.

E a partida foi esquentando até que o juiz resolveu encerrar o primeiro tempo de jogo.

E seguiu o locutor:

Minas Gerais esta brilhando no sul. Com vocês agora os comentário de João Manoel.

Uma vinheta à moda de viola anuncia: "Lá laia João Manoel. Tiririn".

Povo Ipatinguense. O nosso Alviverde esta fazendo uma apresentação maravilhosa no Couto Pereira. Diante de uma torcida de quase trinta mil pessoas que tenta apoiar o Campeão Brasileiro de 1985, o Ipatinga não se faz de rogado. Com facilidade desce rapidamente ao ataque e apresenta-se com perigo à meta adversária. Esta jogando no sistema quatro, quatro dois. A equipe do Coritiba acusou o golpe a partir da metade do primeiro tempo e demonstra-se abalada. Não há dúvida de que o Ipatinga tem condições de levar estes três pontos para Minas Gerais. Foram cinco finalizações do Tigre contra apenas uma do Coxa.

O mineirinho deixa escapar um sorriso maroto.

Levanta-se e começa a dançar uma Catira* ao som de uma viola imaginária, exibindo-se para seu porquinho que, feliz, acha que vai ganhar uma farta porção de alimento. A vitória sobre o alviverde do sul, colocaria seu time na primeira posição do campeonato, e com isso, por certo levaria o tigre à primeira divisão do futebol brasileiro.

Ele então ajeita o cajado e espera o apito do segundo tempo de cócoras, como havia passado o final do primeiro tempo inteiro, momentos em que seu time pareceu ter melhor sorte. Lógico que o mineiro não acredita em superstição, mas seria uma tolice deixar o Tigre perder a partida por mudar de posição.

Então o mineirinho olha para o porquinho gordinho e diz:

Se o Ipatinga ganhar esse jogo, vamos ter que comemorar. Esse jogo define se o Tigre vai subir para a primeira divisão. Se ganhar é o fim de nossa amizade. Você vai para o forno Rabicó.

Soa o apito. O segundo tempo começa burocrático novamente. Então o mineirinho lembra do final do primeiro tempo e fica otimista, antevendo a pressão que o Ipatinga faria no final do jogo.

Vinte, vinte e cinco, trinta, trinta e cinco minutos e nada.

O porquinho enclausurado esta suando frio enquanto o cronômetro do juiz movimenta-se preguiçoso. A criatura quase chega a desfalecer cada vez que o Ipatinga vai ao ataque. Ali parecia surgir o primeiro porquinho pó-de-arroz torcedor do Coritiba nas belas terras mineiras.

Quarenta minutos e Gustavo cabeceia a queima roupa contra a meta ipatinguense, e o porquinho vê suas chances se esvaindo, pois o Ipatinga não iria desistir dos três pontos.

O mirneirinho logo percebe que esse Gustavo é perigoso. Pouco depois de entrar no campo já esta lá dando trabalho para o goleiro da representação mineira. Mas quando aos quarenta e cinco minutos o Juiz expulsa Gustavo do Coritiba, o mineirinho exclama:

“Eita juizinho bão sô.”

O raciocínio do porquinho começa a viajar em uma velocidade inimaginável. Ele começa então a imaginar uma fuga do chiqueiro. Deve haver alguma forma de sair daqui. Agora, sem o atacante Coxa, é certo que o Tigre vai atropelar. O porquinho já começa a imaginar o seu traseiro assado no forno à lenha.

Não houve nem tempo para o porquinho ouvir o “sô” que encerrava a frase, e o Juiz assinala um pênalti contra o Ipatinga.

O mineiro agarra-se no cajado como religião, e começa a pensar positivo deixando fugirem as exclamações:

O goleiro vai pega! Vai pega! Vai pega!

Então a Rádio Ipatinguense Nacional dos Chapadões faz a seguinte narração:

Minas Gerais esta com você Fred! Ipatinga inteira tem certeza de que você vai pegar esse pênalti. O Tigre passa por momentos difíceis na Capital Paranaense.

Então o comentarista faz sua função:

A meu ver não foi pênalti. O atacante do Coritiba projetou seu corpo sobre o zagueiro do Tigre. Mas diz o velho ditado do futebol: pênalti roubado não entra.

Volta o narrador.

Atenção. Está autorizado. Anderson Lima correu para a bola, bateu espaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaalmaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa Fred! Defendeu! Defendeu! Defen... Mas o juiz mandou voltar. O auxiliar esta dizendo que Fred se adiantou. Não valeu! Não valeu! Vai cobrar novamente. O que é isso? Vai fazer voltar a cobrança. Acredite Ipatinga! O juiz mandou voltar a cobrança. Que tristeza povo mineiro.

O comentarista:

Isso é um roubo! O juiz está prejudicando o Ipatinga deliberadamente. Cadê a Comissão de Arbitragem da CBF?

O mineirinho dá uma cuspida no chão e bate o cajado com força no palanque da varanda. Mas ele percebe que há algo escrito nas estrelas. O goleiro vai pegar, ele imagina firmemente.

O narrador:

Vamos Fred! Você consegue novamente. Atenção. O juiz esta autorizando. Anderson Lima olha para a bola, correu, bateu Defendeeeeeeeeeeeeeeeeuuuuuuuuuuuuuuuu! Defeeeeeeeeeeeeeendeeeeeeeeeeeeeeeeeeeuuuuuuuuuuuuu Fred! Defen... Não acredito. O que é isso meus senhores? O juiz esta mandando voltar novamente. Mais uma vez o auxiliar levanta a bandeira para assinalar a irregularidade. O juiz esta anulando dizendo que Fred se adiantou. O que é isso meu senhor?

Sem que possa se controlar o mineirinho cospe agora no próprio rádio.

Comentarista:

Isso esta virando caso de polícia. O Ipatinga esta sendo operado em terras paranaenses. Não é possível que isso esteja acontecendo.

O mineirinho então olha para o porquinho. O porquinho por sua vez começa a duvidar da capacidade de Anderson Lima bater o pênalti de forma eficiente. Nesta hora o mineirinho se irrita e se levanta. E com o cajado na mão continua a olhar para o rádio e para o porquinho. Mas para o rádio olha com cara de poucos amigos. O porquinho por sua vez, se pudesse estaria fazendo figas.

Não adianta. O juiz mandou voltar.

O mineirinho então começa a lembrar da moda de viola “O Mineirinho e o Italiano”. Pensa então no castigo. E por mais que a lógica o desafie, pois é difícil acreditar que um goleiro colocaria a mão na bola do pênalti por três vezes consecutivas, ele agora pensa:


Vai bater para fora.

E lá vem o narrador:

Atenção. Pela terceira vez vamos para a cobrança da penalidade máxima. Nunca se viu nada igual. Aqui é até aprender seu Anderson Lima. Atenção. Esta autorizado. Anderson olha fixamente para a bola. Atenção correu para a bola, bateu espaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaalmaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa Fred!Defendeu! Defendeu! Defen... Gol. Gol. Gooool. É o que o juiz queria.

O mineiro começa a espancar a coluna de madeira da varanda com seu cajado, e nem percebe que o Juiz mandou voltar novamente a cobrança. O porquinho nessa hora começa a pensar no juiz paulista que estava a garantir o frescor do seu traseiro. Será que el mudou de lado?

O porquinho então fica mais tranqüilo, pois já passam dos cinqüenta minutos do segundo tempo. Por mais que o Coxa não faça o gol, não haverá tempo para um gol do Ipatinga.

O mineiro então se concentra na torcida:

Vai errar. Vai bater para fora. O Fred vai defender.

Mas parece que pela forma com que as coisas estão acontecendo em Curitiba, não haverá um final feliz. É quando o narrador volta:

Senhores ouvintes. Não me recordo de situação semelhante. Pela primeira vez na vida vi um juiz anular três cobranças de pênalti seguidas. Isso é uma vergonha. Eu quero ver o que vão dizer os senhores cartolas da CBF.

E assim ficam por alguns minutos trocando opiniões e externando sua revolta com a situação. O desabafo é repentinamente interrompido quando:

Atenção. Correu, bateu. É gol. Lamenta ....

A transmissão é interrompida pelas cajadadas do mineirinho, que ali, em frente ao porquinho, revela ao animal o quanto violento seria o seu final.

Mas o Coritiba havia conquistado a vitória aos cinqüenta e dois minutos do segundo tempo. O porquinho estava salvo. E nessa hora o porquinho já ousa zombar do mineiro. Foi tomado por uma tranqüilidade tal que interrompeu os seus trabalhos de escavação do túnel que havia programado para a sua fuga.

O porquinho fica ali a admirar o surto psicótico do mineirinho contra seu rádio, até que o mineirinho cansa os braços e entra.

Sobre o chão da varanda apenas os pedaços do rádio e quatro pilhas. Uma para cada cobrança da penalidade que definiu a derrota do Tigre. Eram duas da marca Everedy, uma Nacional e uma Duracel. Então o porquinho ouve o mineirinho atender o seu celular nokia:

Eia sô! Que timinho heim? Ocê ta de brincadeira comigo. Foi roubado sim sinhô. Não adianta fala que não.

O porquinho então começa rir em silêncio, como se estivesse pensando: Mineirinho desgraçado. Queria me matar? Agora agüenta aí o Coxa tirar uma com a tua cara.

E continua a ouvir a conversa:

Puizé! Eu acho que num foi pênalti não. Num foi não.

E seguiu a conversa:

Ahãm. Ahãm. Ahãm. Não sinhô. Uai? Não sinhô. E foi. E foi. Uai?

Repentinamente o mineirinho fala;

Ta bão. Ta bão. Eu reconheço. Perdi a aposta. Pode passar aqui buscar o porquinho que te prometi. Ocê vai levar vivo ou quer levar morto?

FIM

Peço desculpas pela brincadeira e mando um abraço para o povo mineiro, esperando profundamente que Coxa e Ipatinga realmente se mantenham nessas posições e estejam na primeira divisão em 2008.

OS NOMES SÃO DE CRIAÇÃO DO PRÓPRIO AUTOR, NÃO CORRESPONDENDO A NENHUMA EMPRESA OU PESSOA.

E como torcedor Coxa Branca, em reconhecimento pelo belo futebol apresentado, fui pesquisar a história do Ipatinga.


“A HISTÓRIA DO IPATINGA.

Devido à grande demanda de jogos em Ipatinga, de Atlético e Cruzeiro em competições nacionais e internacionais, surgiu-se a necessidade de se criar um clube profissional em Ipatinga, para representar a cidade e fazer uso do terceiro maior estádio de Minas Gerais, o Ipatingão.

No início de 1998, o empresário Itair Machado, ex-atleta de Atlético e Cruzeiro, e até então patrocinador do Social F.C., clube da cidade de Coronel Fabriciano (cidade vizinha de Ipatinga no Vale do Aço), resolveu então criar o Projeto Ipatinga Futebol Clube.

Itair Machado saiu atrás de parceiros, para tirar do papel o projeto. Juntamente com Gercy Mathias, até então presidente do Novo Cruzeiro Futebol Clube (clube amador do bairro Novo Cruzeiro, em Ipatinga), e Cosme Mattos, um antigo desportista da cidade, com o apoio do Dr. Rinaldo Campos Soares (presidente do Sistema Usiminas), Dr. Ronaldo Monteiro de Souza (presidente do Usisaúde), o Sr. Francisco Carlos Chico Ferramenta Delfino (prefeito de Ipatinga), o projeto nasceu grande e ousado.

O primeiro passo foi profissionalizar o Novo Cruzeiro Futebol Clube, que até então era um clube amador da cidade. O clube foi registrado na Federação Mineira de Futebol e, no dia 21 de maio de 1998, a FMF concedeu ao Novo Cruzeiro Futebol Clube o registro de clube profissional, passando a se chamar Ipatinga Futebol Clube, o qual recebeu o nome e cores da cidade.”

(FONTE: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ipatinga_Futebol_Clube )