domingo, 19 de agosto de 2007

NADA ESPECIAL I - por Samuel Rangel

Certas manhãs, nos olhamos no espelho, e não gostamos do que vemos.

É uma daquelas manhãs que nos machucam com seu sabor. Ora, sequer reparamos no ar fresco que ela nos trouxe. De nada adiantou aquele sabiá pousar caprichosamente ao lado de nossa janela. Que dizer então do café saboroso, quente e carinhoso que tomamos na velha e companheira caneca, sem asa, com pintura desbotada?


Outras manhãs são diferentes. Agradecemos a chuva que deixou o dia cinza pois ela embalou nossos sonhos durante a noite. No espelho chegamos a achar que estamos mais belos. O sabiá que ficou calado ao despertar do dia, recebe nosso olhar carinhoso e que admira o seu peito laranja. O café? ... de tão tolos de alegria, esquecemos o açúcar e o leite fora da geladeira, mas nem o amargo do café e nem o azedo do leite são capazes de tirar o sorriso teimoso de nossa face.


Mas como é possível uma mesma pessoa agir de maneira tão oposta?


É fácil perceber que estas coisas acontecem não por culpa do sabiá, do café ou do espelho. O canto do sabia é sempre o mesmo, e pode nos parecer melancólico ou poético. O espelho não muda, nossos olhos é que mudam. O café, doce companheiro de nossas manhãs, tem o sabor de nosso espírito.

Quando nos apaixonamos, ainda que sem a esperada resposta afetiva, encontramos poesia, brilho, beleza em tudo, inclusive em nós mesmos.


Nossos atos não são mais aquele sistemático externar de nossos conhecimentos e idéias, mas sim, um reflexo involuntário e maravilhoso de nossos melhores sentimentos. Nosso rosto não carrega a preocupação das contas que deveremos pagar ao longo do dia, mas revela-se no rosto suave de quem na incerteza, não perdeu a coragem, e ainda que não saiba exatamente o que é vencer, sabe que irá vencer, pois viver já é uma vitória.


Entre dormir, acordar, trabalhar, falar e fazer tantas outras coisas, é melhor torcer para que nossa vida seja uma eterna paixão.

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